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Arquitetos: Felipe SS Rodrigues
- Área: 28 m²
- Ano: 2019
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Fotografias:Guilherme Pucci
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Fabricantes: Alexandre Herchcovitch/Zelo, Americanas, Cota Construções, Etna, Guararapes, Marluce Cortinas, Pedras Bellas Artes, Poio Marcenaria, Tokstok, Yamamura
Descrição enviada pela equipe de projeto. Do Instagram para o Facebook, do Facebook para o WhatsApp, do WhatsApp para os e-mails. Imagens para a cima e para baixo. Dedos rápidos, no celular, na smart TV, no computador, no tablet. O que sobra disso é a vida “ao vivo”, secundária e banal, suporte daquela vida interessante e dinâmica.
Jornais e revistas comprados na banca da frente se acumulam ainda dentro da embalagem sobre a mesa. Celular na mão, uma olhada no Instagram: aquela atriz ruiva que nunca vi atuar. 95 metros cúbicos de apartamento no centro de São Paulo foi uma extravagância irresistível.
WhatsApp: foto do neto, enviada pelo próprio neto. Inicialmente, havia pensado em fazer em estilo “casinha”: um pendente sobre a mesa, chão de taco recuperado de algum apartamento modernista em demolição, plantas no chão, no teto, de baixo para cima e de ponta-cabeça, miscelânea de quadrinhos variados sobre o sofá, um sofá.
WhatsApp: 2 mensagens não lidas. Na memória da infância todo o aconchego da casa da avó: quadros, objetos, cortinas, tapetes. E-mail: boleto com a parcela do apartamento. Por aqui, as tarefas se resumirão a lavar roupas, tomar banho e dormir; por comer fora, quase descartei a cozinha do projeto. Instagram: 7 não lidas. Ao arquiteto foi solicitado eliminar, remover, tudo que não fosse essencial – demandei um bom sinal de wifi.
Antigamente, as pessoas acumulavam coisas, objetos e utensílios, se agarravam neles acreditando que estas coisas eram definidoras de sua personalidade, e que assim como as coisas suas vidas se perpetuariam. Facebook: hoje é seu aniversário. De fato, nem piso, nem parede, nem teto; um único material encapsula o ambiente. Ainda que nem os carros nem as pessoas voem, não fui obrigado a enfatizar a banalidade do chão como sempre se fez.
E-mail: 5 não lidos. Ao chegar em casa, liga-se a TV. Eu ligo a TV, não é ela que liga sozinha, como naquele breve ato da automação residencial que um dia ofereceu a última fantasia futurista. Ligo a TV, mas não assisto a TV, do mesmo modo que tomo o celular para não ligar para ninguém. Estes instrumentos são evidentemente, o cavalo de troia para a verdadeira comunicação; por enquanto camuflados em objetos reconhecíveis.
Da mesma maneira, não gostaria que este apartamento fosse placebo de uma ilusão da eternidade, ou transição para alguma coisa que ainda não tem nome. Na dúvida, nenhuma superfície foi violada, por pinturas abstratas, paisagens rurais, por fotografias em preto e branco, ou qualquer moldura que borrasse o sentido do presente. Fora do digital, dispenso metáforas. Quando as caixas de mudança chegaram perguntei para o arquiteto se aquelas seriam as caixas que pedi.
A sensação de entrar em um ambiente puro, livre e vazio fazia parte do nosso acordo. Ele encaixotou eletrodomésticos e roupas para mim permanentemente, em caixas de madeira. Facebook: 127 mensagens, WhatsApp: 9 mensagens, Instagram: 8 mensagens, e-mail: 9 não lidos, 5 ligações perdidas. Ainda tenho uma sensação de que este apartamento é excessivo. Talvez seja o tapete, ou o livro do Sebastião Salgado.